N�o sei exatamente em que momento comecei a despertar. S� sei que tudo come�ou a ganhar uma cara que, no fundo, eu j� conhecia, mas havia esquecido como era. Comecei a despertar do sono est�ril que, com suas m�os feitas de medo e neblina, fez minha alma calar. E foi ent�o que comecei a ouvir o canto de for�a e ternura que a vida tem. S� ent�o a gente come�a devagarinho, para n�o assustar o medo, a refazer o caminho que nos leva a parir estrelas por dentro e a querer presentear o mundo com o brilho do riso que elas cantam. S� ent�o a gente come�a a entender o que � esse sol que mora no cora��o de todas as coisas. N�o importa com que roupa elas se vistam: Ele est� l�. Comecei a sair dos meus desertos. E a olhar, ainda que timidamente, para todas as miragens, sem tanto desprezo, entendendo que havia um motivo para que elas estivessem exatamente onde as coloquei. Nenhum livro, nenhum s�bio, nada poderia me ensinar o que cada uma me trouxe e o que, com o passar do tempo, continuo aprendendo com elas. Dizem que s� � poss�vel entendermos alguns peda�os da vida olhando para eles em retrospectiva. Acho que � verdade. S� sei que descobri que a solid�o � estar longe da pr�pria alma. Que ningu�m pode nos ferir sem a nossa cumplicidade. Que, sem que a gente perceba, estamos o tempo todo criando o que vivemos. Que o nosso menor gesto toca toda a vida porque nada est� separado. Que a f� � uma palavra curta que arrumamos para denominar essa amplid�o que � o nosso pr�prio poder. N�o importa todos os rabiscos que j� fizemos nem todos os pap�is amassados na lixeira, porque todo texto bom de ser lido antes foi rascunho. E, por mais belo que seja, � natural que, ao rel�-lo, percebamos uma palavra para ser acrescentada, trocada, exclu�da. A aus�ncia de uma v�rgula. A necessidade de um ponto. Uma interroga��o que surge de repente. Pois viver � refazer o pr�prio texto muitas, incont�veis, vezes.